Exposição "O que nos sustenta?"
Beja, 14 nov 2025, 14:30h
Local Núcleo Visigótico do Museu Rainha Dona Leonor
Entrada livre
Projeto desenvolvido por oito alunos da Escola Mário Beirão, em Beja, e pelo artista Francisco Trêpa, acompanhado pelos professores Mariana Conduto e Jorge Simão, no contexto de uma residência artística promovida pelo Festival Futurama.
A questão que o título da exposição coloca é certamente vaga, mas com uma amplitude suficiente para reunir os diversos universos aqui apresentados. Sustenta-nos o nosso esqueleto? Sustenta-nos a nossa família? E uma música, pode ser o nosso sustento? Um fazer? Uma cadeira, quando nos sentamos? E quando tanto nos falha, poderá a escola assumir esse papel?
Neste museu — o Núcleo de Arte Visigótica — vemos as ruínas do que já sustentou. Colunas símbolo de poder que um dia ruíram para, séculos mais tarde, serem de novo postas de pé. Hoje são símbolo da fragilidade e da efemeridade das civilizações e, simultaneamente, da perenidade dos objetos e das pedras que nos contam a nossa história. Aqui percebemos que esta região de Beja foi habitada por diversas culturas, tal como hoje é, tal como no futuro será. E este é um ponto de encontro entre o espólio do museu e a escola: a diversidade.
Os alunos foram desafiados a olhar uma coleção incolor e fria e a devolver-lhe cor e vida. A partir das suas escolhas, desenvolveram uma pintura sobre uma forma contentora (taças que evocam a ancestral importância de guardar, sustentar e transportar) inspirando-se em motivos gravados nas pedras do núcleo. Paralelamente, re-interpretaram detalhes arquitetónicos das colunas visigóticas, criando pequenas esculturas pensadas para integrar e transformar a cadeira onde se sentam na escola, esse dispositivo expositivo que liga o quotidiano escolar ao espaço museológico.
Na base deste projeto assenta a liberdade e a importância do gesto criativo, bem como as interconexões que este pode gerar nas instituições e, sobretudo, nas pessoas. O ambiente escolar levanta diversas questões, e uma delas é evidente: nem todo o aluno se adapta ao sistema escolar, por qualquer motivo que seja. Esta é uma realidade presente nas escolas do país e do mundo. Falta ao sistema educativo uma maior capacidade de adaptação às singularidades humanas, um dos grandes desafios da educação.
Qual é, então, a escola do futuro? E como poderá ela evoluir para que o ensino encontre novas vias de chegar aos alunos, tornando-se a catapulta daqueles que, sem ele, teriam menos oportunidades? Ser bem-sucedido durante os anos obrigatórios de ensino não significa sê-lo na vida. E, afinal, o que é ser bem-sucedido? O sucesso é uma medida sempre relativa, e talvez resida em gestos simples, como o de cultivar um jardim. Contudo, a escola pode ser também sustento para muitos: um espaço onde se aprende a reconhecer o valor do próprio gesto e do próprio caminho.
O curso de cerâmica da Escola Mário Brandão, destinado a alunos do 9.º ano, funciona como um desvio necessário ao sistema escolar tradicional. Através do fazer e da experimentação, jovens com dificuldades em adaptar-se ao modelo de ensino convencional encontram aqui outro, assente na criação artística e artesanal.
O projeto propõe-se pensar a criação como um lugar de transmissão e de sustentação: um território partilhado entre o gesto artístico e o gesto pedagógico. O papel do artista não é o de ensinar uma técnica, mas o de abrir espaço para a dúvida e a descoberta. O diálogo com o museu visigótico não é apenas formal, entre colunas e cadeiras, mas também simbólico: entre o que resiste e o que aprende a sustentar-se; entre a matéria que já teve um uso e aquela que ainda procura o seu lugar.
Nesta instalação cruzam-se arqueologias diversas: as do passado histórico, os vestígios da arte visigótica, e as do presente, inscritas pela juventude que, ano após ano, ocupa aquelas cadeiras. Trata-se de uma resignificação da herança regional e de um gesto que faz com que estes oito alunos passem também a fazer parte da história que aqui se conserva.
Francisco Trêpa (1995) é um artista português que vive em Lisboa. Com formação em cerâmica pela Escola Artística António Arroio (2013), é licenciado em Escultura (2017) e Mestre em Arte Multimédia (2022) pela Faculdade de Belas Artes da ULisboa. Exibe, nacional e internacionalmente desde 2015, em diversas galerias e instituições. O seu trabalho está representado na coleção Antonio Cachola (MACE), na coleção da Fundação PLMJ e em varias colecções privadas. Em 2024, foi nomeado finalista do Prémio Novos Artistas da Fundação EDP. No mesmo ano, venceu o Grande Prémio do Sovereign Portuguese Art Prize. No momento prepara a sua exposição individual, O Baile dos Bugalhos, para o Centro de Arte Moderna da Fundação Calouste Gulbenkian, a ser apresentada em setembro de 2025.
A prática de Francisco Trêpa investiga relações simbióticas que sustentam sistemas ecológicos, existenciais e afetivos, utilizando uma variedade de materiais para criar esculturas e instalações que sondam, e finalmente incorporam, conceitos como transmutabilidade e hibridismo. O seu corpo de trabalho mais recente cria um meta-universo inspirado no mundo vegetal, nos vínculos e cruzamentos entre plantas e animais, como a polinização, e nas complexas relações entre animais não-humanos e a humanidade no Antropoceno. As suas esculturas apelam aos fenómenos proporcionados pelo sensorial, aproveitando dimensões estéticas e poéticas para fomentar consciência e reflexão. Assim, as suas obras tecem narrativas visuais que convidam à contemplação e ao questionamento, combinando simbolismo, emoção, forma e pensamento. O seu trabalho revela-se prolífico, utilizando a imaginação, e o grau de infinitude que esta proporciona, para desdobrar e expandir as formas que a matéria (a cerâmica, a madeira, a cera) assume na sua prática. Nos últimos dois anos, os “atores principais” deste meta-universo têm sido personagens fictícios, sem género, que nos contam as suas histórias e tentam fugir às categorias do nosso mundo.